terça-feira, 27 de março de 2007

O MENINO-PRODÍGIO


Numa altura em que a contagem decrescente para o jogo do ano já começou, tudo indica que o brasileiro Anderson vai mesmo regressar à competição no domingo, no Estádio da Luz, diante do Benfica, precisamente o adversário do jogo em que sofreu a grave lesão. O astro canarinho, e não acho exagerado denominá-lo desta forma, deixou todos os aficionados de futebol orfãos do seu talento de excelência. Por isso, como forma de lhe dar as boas-vindas, vou abaixo transcrever um texto escrito por mim a 24 de Setembro de 2006, tempo em que o puto começou a maravilhar todos os que gostam de futebol no seu estado mais puro:


"Já não restam dúvidas... Aquele puto brasileiro que joga no meio-campo do FC Porto é mesmo um portento, um talento puro, um génio! Chama-se Anderson e tem 18 anos! Chegou a Portugal com apenas 17 e rotulado de craque; tinha-se cotado como o melhor jogador do Mundial sub-17. Apesar disso, as expectativas foram sendo controladas, pois se ninguém duvidava que talento não faltava ao jovem canarinho, importava também ter em consideração a sua idade. A vida de futebolista profissional nada tem a ver com aquela que se tem nas camadas jovens. Não basta ser bom de bola e ter habilidade nos pés para fazer uns dribles. É preciso ter forte personalidade, aguentar a pressão de jogar ao mais alto nível diante de milhares de pessoas, não ceder emocionalmente ao stress de ser a cada instante avaliado pelas acções que se têm dentro daquele rectângulo verde.

Nesta temporada, Anderson tem estado a revelar-se como um portentoso executante, um diamante em bruto, que bem lapidado nos próximos tempos por Jesualdo Ferreira, se tornará certamente num dos mais fantásticos e geniais jogadores do mundo. Muita gente dirá que há jogadores que prometem muito no início da carreira e depois se perdem progressivamente à medida que as exigências vão aumentando. Mas este é um caso especial, este não engana! O já internacional sub-20 brasileiro (a selecção principal já está à sua espera...) não se limita a ser mais um jogador muito tecnicista que de vez em quando se lembra de fazer aquelas jogadas que arrancam fortes aplausos da plateia. Este menino que ainda agora atingiu a maioridade, é daqueles que usa a magia que tem nos pés (sobretudo no esquerdo) para pegar na equipa, transportá-la para a frente; eu diria para andar com ela às costas. Tem 18 anos...

Apesar de o técnico portista ter já referido que o desempenho da equipa depende do colectivo e nunca de um só elemento, não foi por acaso que o confrontaram com a ideia de que o talento prodigioso de Anderson pode já estar a criar dependência na turma azul e branca. E para mim não há grandes dúvidas. O FC Porto com Anderson em campo é muito diferente do FC Porto sem ele. Basta pensar no que aconteceu nesta sexta-feira, no Dragão, no jogo com o Beira Mar. Entrou em campo apenas ao intervalo para substituir Jorginho, precisamente o jogador que actuou no seu lugar, na posição 10, no espaço de construção da equipa. E então a primeira parte portista foi cinzenta, praticamente sem jogadas de perigo junto à baliza aveirense, sem ideias, sem velocidade ou criatividade. Com a entrada de Anderson, a segunda metade foi completamente distinta; a diferença na qualidade de jogo do FC Porto foi algo abismal. O ritmo a que se passou a jogar subiu meteoricamente, todo o jogo portista passou a ter um patrão, alguém que não se limita a estar na sua posição à espera da bola para então construir os lances de ataque, mas que enche o campo em correrias loucas à procura da bola, atrás e à frente, capaz também de lutar pela sua recuperação e, do mesmo modo, elaborar a transição para o último terço adversário. E depois quando a bola chega áqueles pés, como que ganha outra vida e entra numa dimensão superior, parecendo que é intima do jovem brasileiro e que, por isso, merece ser tratada com todo o carinho do mundo.

Ao ver aquele jogo (ao vivo...) fui obrigado a deixar-me enfeitiçar pela magia do '10' portista. Perdi a conta às vezes em que me impressionei com as suas jogadas e então passei a vida a dizer: "Eii, o Anderson..."! De cada vez que dominava a bola, fazia um passe a rasgar a defesa, passava por um, dois, três adversários ou simplesmente corria para que lhe passassem a bola, eu perguntava-me como seria possível que um miúdo de 18 anos (é bom não esquecer este pequeno pormenor!) tivesse já tanto futebol no cérebro. Com ele em campo, os seus companheiros têm uma linha de passe permanentemente aberta, porque ele não pára de procurar o espaço vazio para poder receber o esférico. Não raras vezes, em situações de posse na zona defensiva, é vê-lo vir atrás buscar jogo, para ser ele a conduzir a equipa para a frente com aquela velocidade frenética, própria de quem tem um pulmão jovial e inesgotável. Depois, com um simples passe ou uma aceleração momentânea consegue desequilibrar uma defesa inteira, algo que normalmente é bem mais complexo de conseguir. Foi, de facto, um jogo enorme de Anderson, indiscutivelmente o MVP da partida, talvez tendo até realizado o seu melhor desafio desde que chegou a Portugal. E note-se que já havia efectuado algumas excelentes exibições, como no jogo com o Setúbal para a Supertaça, em que assinou um golo, ou na estreia na Liga dos Campeões diante do CSKA Moscovo, cujo lance mais vistoso foi um espectacular remate de 25 metros ao poste. Parece impossível...

Efectivamente, há que dar mérito aos responsáveis do FC Porto por terem vislumbrado e agarrado primeiro que os outros tão valiosa pérola. É um grande privilégio para o futebol português poder ter nos seus relvados um jogador deste calibre, assim como é um estímulo para os adeptos irem mais vezes aos estádios presenciarem o espectáculo ao vivo. Sim, porque quando se vai ao estádio, é à procura de espectáculo, de futebol bem interpretado, jogadas bonitas, golos... E pensar que Anderson tem ainda, naturalmente, uma larga margem de progressão... Chega a ser assustador aquilo que poderá vir a ser no futuro! E é neste ponto que surge uma pergunta tão pertinente quanto inevitável: até quando conseguirão os 'dragões' segurá-lo no clube? A resposta não é fácil. No entanto, o presidente Pinto da Costa, face à cobiça desde já existente por parte de grandes clubes europeus, como o Barcelona ou o Chelsea, veio dizer que não pretende deixar sair nenhum dos principais jogadores do plantel durante esta temporada, lote onde obviamente se inclui o menino-prodígio brasileiro. Uma posição normal de uma pessoa que percebe que seria muito pouco inteligente negociar agora ou brevemente um jogador desta categoria. Além das implicações desportivas nefastas que decerto traria, quanto mais tempo ele se mantiver no Dragão, maior será a quantia a entrar nos cofres azuis e brancos na altura da possível tranferência. E não é difícil perspectivar uma valorização rápida, dada a sua presença em grandes palcos, sobretudo na Champions, bem como a iminente chamada à selecção principal do Brasil; assim o seleccionador Dunga entenda que não vale a pena esperar mais. Se os portistas o conseguirem segurar pelo menos mais dois anos, considero que já será positivo e arrisco até um valor para a sua transacção: 40 milhões de euros!

Estabelecendo um paralelo com os seus colegas, é minha convicção que Anderson é já o melhor jogador da equipa, à frente de nomes tão insuspeitos como Lucho González, Quaresma, Helton ou Raúl Meireles. Está encontrado o novo '10' para o FC Porto, pensador e arquitecto do seu futebol ofensivo. Uma lacuna que persistia desde a saída de Deco para o Barcelona, no final da época 2003-04, de tão boa memória para os portistas. Se continuar a jogar tão supremamente como o fez defronte do Beira Mar, Anderson poderá transformar-se muito em breve num caso sério em todo o mundo e levar o FC Porto a voos bem altos, já que, neste momento, a formação da Invicta é Anderson e mais dez! Façam como eu... deixem-se enfeitiçar!"

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